Por diversas razões nunca viajei a
longas distâncias nem jamais saí do Brasil, salvo, “excusez du peu”, para ir a Rio Branco ou Artigas, na
fronteira uruguaia. Rigorosamente, só gostaria de ter viajado um pouco mais
pelo Brasil, para conhecer alguns lugares da Amazônia e do Estado do Rio,
Petrópolis, Vassouras, onde viveram antepassados. E mais São Luiz do Maranhão,
que vale até o sacrifício de visitar o Sarney. No rumo do norte não ultrapassei
Recife e a Paraíba, e no Centro-Oeste
não fui além de Brasília. Do estrangeiro só conheço o que me ensinaram os
livros, os álbuns e as revistas. Mais as cartas dos irmãos diplomatas e dos
filhos viajores.
É que sou irremediavelmente um
monoglota, só escrevo e falo em Português, e, por isso, acho que não teria
graça visitar países onde só pudesse me comunicar com guias turísticos e
porteiros de hotéis. Acho imprescindível a fraternidade do boteco, a leitura do
jornal local, a audiência direta dos nativos. Conhecer um país através de imagens,
filmes, vídeos e agências de viagens nunca me atraiu. Talvez porque sempre fui
vidrado na pesquisa de fontes primárias, de livros e documentos originais.
De resto, os encargos de família não
foram leves, enquanto eu era jovem. Com 7 anos de casamento, eu e a Nezinha já
tínhamos três filhos. Quando já estávamos mais folgados, à beira dos 40 anos de
idade, convocamos mais dois para
enriquecer a caravana. Excetuado um curto período, entre a infância do Miguel e
o nascimento do Fernando, sempre havia um traseiro sujo a reclamar cuidados e
fraldas por trocar. Isso matava eventuais pretensões turísticas que aliás não
cultivávamos, nem eu nem a Nezinha . Basta dizer que moramos l ano e meio em
Quaraí, na fronteira com o Uruguai, e nunca fomos sequer a Montevidéo.
Dispensado do
sacrifício dos vôos prolongados, dos aeroportos, das estações rodoviárias e
ferroviárias, das bagagens, da compra de passagens e das operações de câmbio,
delego todas essas torturas aos meus filhos, que amam viajar e galopar pelo
mundo. Dou-lhes procuração para que viajem por mim à foz do Prata, ao Caribe, à
França, ao trepidante São Paulo e até à Indonésia... Um neto corajoso já foi
sozinho à Patagônia e, mais tarde, à Islândia. Eles me
transmitem todos os ensinamentos que eu desisti de assimilar e me repassam
emoções de que eu me poupei. Agora esteve o Miguel com mulher e filha em
Portugal, fazendo uma viagem maravilhosa, que, esta sim, causou inveja a este
velho lusófono e lusófilo, devoto de Camões, de Guerra Junqueiro e Eça de
Queiroz. O filho chegou ao histórico promontório de Sagres, sede da escola
náutica de Henrique, o Navegador, foi tocado pela emoção de contemplar o Mar
Oceano do alto daqueles rochedos, e sentiu o desafio que ele representava para
os homens do século XV, que ainda estavam descobrindo os segredos de velejar,
de medir longitudes, de ler cartas náuticas e de sobreviver às tempestades.
Acho que a emoção do Miguel foi a mesma que me atingiria se eu lá estivesse.
Deve ter sido um fiel e “bastante procurador”.
2 comentários:
Caro José Alberto, gostei muito da crônica do Dr. Sérgio.
Ele, sem viajar acompanhou tudo que lhe interessava através de relatos dos filhos e netos.
Isto é muito bom porque faz a imaginação trabalhar e ter uma visão da realidade.
Um abraço, Hunder
Como sempre, uma leitura super agradável. Abraço.
Postar um comentário