Era usual falar-se em “beira do Guaíba” ou
”margem do Guaíba”, como os demais rios, arroios ou lagos da província. E a
“beira” era tão popular que até serviu para denominar o estádio do
Internacional, construído em terreno generosamente doado pela Prefeitura de
Porto Alegre: o Beira-Rio, sem mais retoques. Mas eis que o Município resolveu
enfeitar e reurbanizar um trecho de sua popular “Avenida Beira Rio”,
oficialmente rotulada de “Edvaldo Pereira Paiva”, desde o tempo do Prefeito
Alceu Collares que a construiu e inaugurou.
O importante eixo viário que desafogou o tráfego para a Zona Sul não foi
tão celebrado e homenageado como vem sendo agora esse pequeno trecho, que
ganhou alguns melhoramentos e enfeites, no espaço entre a Usina Elétrica
(erradamente chamada de usina do Gasômetro) e o monumento das cuias, também
conhecido como “monumento das tetas”. Os veículos de comunicação ou os próprios
órgãos da Prefeitura, ou fosse lá quem fosse, desde logo começaram a falar num
projeto de revitalização da ORLA do Guaíba. Não era a beira do Guaíba, nem a
margem do Guaíba. Era a ORLA. Mesmo que o termo não fosse de uso corrente e que
o povão falasse habitualmente em BEIRA do rio, como já falara outrora em “Rua
da MARGEM”, para referir-se à margem do arroio Dilúvio. E tanto se bateu na
tecla da ORLA, que esse termo deixou de ser substantivo comum, para se tornar
em Porto Alegre um nome próprio, merecedor até de inicial maiúscula. Dias atrás
uma pessoa me perguntou se eu já tinha visitado a Orla. Sem me dizer orla de
onde ou orla de quê.
Os especialistas em Linguística poderão
esclarecer se esse prestígio súbito de certas palavras pode acontecer e porquê.
E foi forçoso que me lembrasse dos ACRÍDEOS. Foi isso lá pela década de 1940.
Houve em Porto Alegre e arredores uma praga de gafanhotos, que devastou hortas
e jardins, tomando vulto na pauta dos jornais da época. E meus colegas da
imprensa, no louvável anseio de enriquecer cientificamente seus textos,
consultaram especialistas em insetos e descobriram que o popular gafanhoto
pertence à família zoológica dos acrídeos. E, de uma hora para outra, não se
falou mais em gafanhotos, mas em acrídeos. Os acrídeos atacavam em Viamão e
Gravataí; nuvens de acrídeos aterrorizavam Belém Novo e Vila Nova. E tal foi a
popularização dos acrídeos que, no primeiro Carnaval, um grande bloco, creio
que da Baronesa ou do Partenon, intitulou-se “Acrídeos do samba” e desfilou no
Centro com o estandarte de um vistoso gafanhotão. Era a entomologia triunfante,
saindo das academias e ganhando as ruas... A ORLA ganhou prestígio semelhante
aos acrídeos.
3 comentários:
Bela crônica de alguém que escreve bem, mas, sobretudo, de quem sabe viver a sua cidade, com amor e memória ...
Excelentes textos e fotos, bom JOSÉ ALBERTO. Você sabe como colocar as coisas para nos fisgar. Em qualquer lugar que a gente lance o anzol, o coloquial forma um sensível visgo.
Baitabracito, Beijo, Bença e Tchau, aqui do irmãozinho e amigo,
Aguinaldo
É sempre bom ler um texto sobre este assunto, foi ali que Porto Alegre começou. Trabalhei por 15 anos da 1ª Delegacia de Polícia, situada na rua General Canabarro esquina Riachuelo,o que eu ouvi de história sobre a rua da Margem, das execuções no Alto da Bronze, da rua da Paineira, o homem que fazia linguiça de carne humana.
O centro de Porto Alegre tem muitas histórias.
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