
O monstro sagrado Glênio Reis, querido patrono desse blogue, manda pautar uma matéria sobre um ilustre conterrâneo e glória da nossa MPB: Edu da Gaita. Este celebre instrumentista, nascido em Jaguarão a 13 de outubro de 1916, recebeu na pia batismal o nome de Eduardo Nadruz. Apresentado em 1934 a César Ladeira, da Rádio Mayrink Veiga/Rio de Janeiro, este lhe propôs o nome artístico pelo qual é conhecido até hoje, por ser anti-radiofônico o de nascimento. Contratou-o na ocasião para fazer o prefixo de um novo programa, cujo tema escolhido foi o de “O Gordo e O Magro”.
Aos 10 anos, família radicada em Pelotas, arrebata um concurso promovido pela fábrica de gaitas Hohner, onde participaram cerca de 300 alunos dos colégios Gonzaga e Pelotense, sendo premiado com 200 mil réis. Dos 15 finalistas que realizaram o espetáculo no Teatro Guarani, Edu foi o último a se apresentar, quando então se consagrou praticamente com uma gran finale de trechos de ópera, começando com a Tosca, seguindo-se Fausto, Rigoleto, Madame Butterfly, La Traviata, Cavalaria Rusticana e arrematando com a protofonia de O Guarani para delírio do público.
Com a crise em seus negócios, Aref, o pai de Edu, viu-se forçado a encaminhá-lo em 1933 para São Paulo a fim de conseguir emprego e ajudar nas despesas da família. Com o capital de 300 mil réis desembarcou primeiramente em Santos e depois se dirigindo a São Paulo, na famosa rua 25 de março, reduto da colônia árabe paulistana, onde teve de encarar o clima de animosidade contra os gaúchos desde a revolução de 32. Tantas dificuldades e sem recursos para seu sustento, Edu teve de abandonar a pensão onde morava, perambulando em pânico e sem destino pelas ruas centrais de São Paulo.
Nessa caminhada, acontece de avistar dois mendigos, um deles tocando gaita enquanto o outro arrecadava as esmolas dos passantes. Dá-se um estalo na cabeça dele que logo acorre à tradicional casa Manon, situada ali perto, e pergunta ao gerente se tem gaita para vender. Este lhe diz que não consegue negociar um estoque antigo. Sem vacilar, Edu faz uma proposta e acerta uma comissão de 30% caso vendesse as mesmas. E ele escolhe uma das gaitas entre as duas dúzias encalhadas e começa a tocar na porta da loja, iniciando a sua carreira de músico ambulante. Em duas horas, liquida a fatura.
Em 1937, é convidado a participar de espetáculo no cassino Copacabana, porém, teve de apresentar carteira profissional e para isso providenciou o encaminhamento no Ministério do Trabalho, cuja burocracia não define a sua profissão, terminando por lhe enquadrar como músico “excêntrico”. Daí em diante, passou a viver uma estranha dicotomia em que era considerado um “popular atrevido” para a área erudita e, ao contrário, “erudito” na área popular.
No Brasil, a harmônica de boca não possuía cátedra, razão pela qual nosso personagem tanto se empenhou em vida por elevá-la ao seu justo patamar, atingido com a sua pioneira execução do Moto Perpétuo, de Paganini (http://www.youtube.com/watch?v=KrriLcEPiOk). Tanta dedicação só poderia resultar mesmo num prêmio inesperado, quando a 22 de novembro de 1958 se viu coroado de sucesso com sua execução acompanhado pela Orquestra Sinfônica Brasileira , em primeira audição mundial, no Teatro Municipal do Rio de Janeiro, do “Concerto para Harmônica e Orquestra de Câmera”, de Radamés Gnattali, sob a regência do autor.
Ressalte-se o grande amor pela sua pátria que jamais pensou deixá-la, apesar dos conselhos dos amigos e das inúmeras oportunidades conquistadas no exterior. Preferiu ficar aqui, esquecido e pobre, conforme veio a falecer em 23 de agosto de 1982.