Li na semana passada o interessante
livro de Luiz Felipe Pondé, FILOSOFIA PARA CORAJOSOS, presente de Natal do meu
neto Jonas. E ainda que aquele filósofo me pareça às vezes superficial, ele não
deixa de nos transmitir algumas verdades chocantes, que nos obrigam à reflexão.
Uma delas diz respeito à longevidade, em geral saudada como grande conquista do
nosso tempo, mas que ele cerca de reservas muito ponderáveis. “Transcrevo o
próprio Pondé: “O mundo moderno burguês em que vivemos é um lugar pautado pela
lógica da eficácia em que tudo é medido pelo seu valor “instrumental”, ou, dito de outra forma, pelo seu valor “de
uso”. “Você vale pelo que faz funcionar
neste mundo. Idosos hoje não valem nada, apesar de dizerem o contrário. Ficam
brincando com computadores e Facebook para parecer parte deste mundo. Claro, os
idosos com grana têm seu lugar na cadeia de consumidores de bens de valor”.
Depois dessa importante lição, em que
nos convence de que estamos sujeitos a prazo de validade, ele ainda escreverá
mais adiante: Eis que a longevidade está
aí. Vive-se muito, e uma das primeiras coisas que os governos têm de fazer é
adiar a aposentadoria, porque ao lado da longevidade está a infertilidade das
mulheres seculares, o que gera o famoso problema da previdência: não tem jovem
bastante para bancar tanto idoso querendo ser feliz. Afora essa questão de
gestão, a longevidade cria outros traumas. Como os vínculos são cada vez mais
efêmeros entre as pessoas, e a atomização é crescente, a tendência é a solidão
ser a outra face da longevidade. Pessoas vegetam em suas casas, quando têm
casas, ou abrem-se novas casas de repouso. Claro, existe até uma nova ciência:
gerontologia.
É evidente que o livro de Pondé não é de
autoajuda. Se já estávamos mais ou menos preocupados com a ultrapassagem do
prazo de validade, a perspectiva de uma longevidade em solidão não é nada
animadora.
O interessante é que o nosso
inconsciente reage, e, pelo menos em sonhos, reassumimos as funções do passado,
voltamos a ter preocupações com o trabalho e a eficiência. A angústia por não
haver entregue à Redação do jornal o artigo agendado é um dos meus sonhos mais
frequentes. E vai ao ponto de tentar escrevê-lo mesmo dormindo.
A preocupação com a
perda de prazos processuais, muito própria dos profissionais do Direito,
seguidamente me assalta. Pelo menos durante o sono, não perdi validade, ainda
me vejo mergulhado no trabalho e preocupado em ter bom desempenho. Parece-me
isso uma justa reação do inconsciente contra o que Pondé sadicamente chama de
“apodrecimento” dos longevos.
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