quarta-feira, 7 de setembro de 2011

A DESPEDIDA DE UMA ÚLTIMA VEZ

Na foto, Fernando Collares e Luiz Mauro no lançamento de "Rua da Praia" (2003). Sempre existe uma última vez sem que se perceba tratar de uma despedida. Já visitei pessoas hospitalizadas que não tiveram oportunidade de obter a alta desejada. Nessas ocasiões, cheguei até pensar em postergar esses encontros para outro dia, porém, algo me impelia a que procurasse confortar o enfermo naquele preciso momento que viria a se tornar, sem que o soubesse, em nosso derradeiro adeus. Conformava-me após com a idéia de ter chegado ali a tempo de demonstrar minha lembrança e afeição com esse pequeno ato de presença, quem sabe, uma inesperada solidariedade humana.

Nesta última segunda-feira, fui colhido pela triste notícia do falecimento do grande amigo Fernando Collares que, há cerca de um mês, sofrera parada cardiorrespiratória, permanecendo em coma desde então na CTI do Hospital Divina Providência. Também fui informado da cerimônia fúnebre ocorrida nesse mesmo dia no Crematório Saint-Hilaire, em Viamão, que deixei de comparecer por impedimentos particulares. Embora abatido por não levar pessoalmente minhas condolências a seus familiares, recordei-me daquela última ocasião em que avistei Fernando ainda com vida, transbordando a sua proverbial alegria.

Esse nosso encontro – se não me engano no início deste ano - aconteceu na agência Menino Deus da Caixa Econômica Federal, onde tinha acabado de fazer um depósito. Já me retirava daquelas dependências quando fui surpreendido pela abordagem do saudoso amigo, convidando-me a que sentássemos ali mesmo na sala de espera a fim de bater um papo descontraído, já que decorria um longo tempo sem nos ver. Enquanto sua esposa, Dª. Sandra, resolvia assuntos pendentes na Gerência, ficamos relembrando agradáveis momentos de uma época em que eram freqüentes as nossas ligações.

Um balde de água fria nesse entusiasmo me veio em seguida, quando o radialista Glênio Reis me deu a notícia de que fora diagnosticado Mal de Alzheimer no estado de saúde daquele velho companheiro. Eu não acreditava, há pouco o tinha visto tão bem e feliz. Falando com o cantor Guilherme Braga, este me confirmou que estava no estágio inicial da doença. E através do Guilherme continuei me mantendo informado da sua acelerada evolução degenerativa. Coisas do destino, indagava-me eu, que nos colocara frente a frente, oportunizando-me gravar em minha mente uma imagem que me legara Fernando Collares, tão plena de otimismo e confiança no futuro.

A primeira vez que assisti o notável cantor foi por ocasião da estreia do espetáculo “Reencontro (O Show tem que continuar)” na Boate Le Club, em 16 de outubro de 1991, do qual participava junto com Guilherme Braga e Maria Helena Andrade, mais acompanhamentos de Paulo Santos (violão/guitarra) e Celso Lima (teclados) e apresentação do veteraníssimo Ary Rego. Conforme prometia o mote caracterizado no convite - “A gente precisa se reencontrar/ com os amigos/ com a música/ com os músicos/ antes que tudo passe/ com a alegria de viver” – todos os presentes fomos aquinhoados por uma noite esplendorosa e inesquecível.

Porém, nosso relacionamento mais estreito só veio a se concretizar em 1999, quando Guilherme Braga me sugeriu o seu nome para integrar o projeto “Por Amor à Música” que estávamos apresentando ao Fundo Municipal de Produção Artística, ao qual destinaríamos três faixas do CD que se pretendía gravar: “Quatro Estações” (Jayme Lubianca), “Minha Oração” (Jorge Machado) e “Sabiá Moreno” (Antoninho Gonçalves). Foi então que tomamos conhecimento da competência e da extrema versatilidade de Collares nos ensaios e nas sessões de gravação ao vivo promovidas pelo técnico Marcelo Sfoggia, tal a sua desenvoltura diante dos microfones.

Daí em diante, passei a me tornar participe da “turma do gargarejo”, assistindo sempre as diversas apresentações de Fernando Collares onde me fosse possível estar presente. Entre elas, no lançamento do CD “Rua da Praia” (2003), no qual interpretava a canção de Tito Madi que deu título ao disco, além de composições de Luiz Mauro (“Nunca é Tarde Para Sonhar” e “Lembranças”) e de Omar Stocker (“É o Amor”, “Ajuda-me Senhor”, “O Sítio”, “Ilha Azul”, “Leite Derramado”, “Poesia Sem Final”, “Sorria”, “Mãe Solteira” e “Mais Que Um Amigo”). Para complementar, reproduzo aqui o link da postagem que fiz no site Caros Ouvintes http://www.carosouvintes.org.br/blog/?p=4836, abordando as letras homônimas, com os respectivos áudios, de Alberto do Canto e Tito Madi.
Temos o grande Fernando Collares
esbanjando a sua jovialidade
que vem contagiando tantos pares,
de romântico, a habilidade.

6 comentários:

Academia de Letras de Crateús - ALC disse...

Na plataforma das despedidas, somente um poeta de sua qualidade dá adeus a um amigo sem tirá-lo do coração! Um abraço meu amigo Josè Alberto, poeta de todas as águas, até as do coração!

Raimundo Candido

Luiz Mauro Pinto da Costa disse...

Realmente lamentável pra nós, esta passagem do Fernando para o outro plano.
Mas ele deve estar mostrando sua arte pra outras platéias, agora.
Te agradeço, Souza, pela divulgação deste registro de uma noite inesquecível pra mim, em que participei do show de lançamento do CD "Rua da Praia".
Grande abraço.

Edemar Annuseck disse...

Mestre José Alberto de Souza,

Lí sua postagem criteriosa e meditei sobre os anos que já se passaram.
Glorias a DEUS por nos ter preservado até aquí porque "Sua misericórdia se renova cada manhã".

Forte abraço amigo,

Edemar Annuseck

Anônimo disse...

Que coisa, ainda ontem te mandei um e-mail falando no Fernando Collares, pensando que ele ainda estivesse vivio.
Relembrei a ti os nossos encontros desde a Casa Civil do Palácio Piratini até um almoço do Vergara no Forno e Fogão há poucos meses quando achei-o bem e cheio de vida e alegria.
Lamento muito o seu desaparecimento e me solidarizo contigo pelo blogue.
Um abraço, Hunder.

Helena Ortiz disse...

Querido Souza,
Não conheci Fernando Collares, mas do jeito como falas nele é como se fosse também meu amigo, tal é o teu sentimento, tal é a verdade que poucas linhas podem trazer à tona. Só tu, e a tua sensibilidade, para aumentar a corrente de pessoas que, nessa hora, pensam em Fernando Collares e admitem que sim, fará falta.

Clarice Villac disse...

Amigo José Alberto,
sua crônica preciosa nos traz sábio testemunho,
viver com alegria e saboreando os encontros, valorizando as oportunidades de conviver com os entes queridos !