sábado, 21 de janeiro de 2017

ELES VIAJAM POR MIM -- Sérgio da Costa Franco

Por diversas razões nunca viajei a longas distâncias nem jamais saí do Brasil, salvo, “excusez du peu”, para ir a Rio Branco ou Artigas, na fronteira uruguaia. Rigorosamente, só gostaria de ter viajado um pouco mais pelo Brasil, para conhecer alguns lugares da Amazônia e do Estado do Rio, Petrópolis, Vassouras, onde viveram antepassados. E mais São Luiz do Maranhão, que vale até o sacrifício de visitar o Sarney. No rumo do norte não ultrapassei Recife  e a Paraíba, e no Centro-Oeste não fui além de Brasília. Do estrangeiro só conheço o que me ensinaram os livros, os álbuns e as revistas. Mais as cartas dos irmãos diplomatas e dos filhos viajores.
É que sou irremediavelmente um monoglota, só escrevo e falo em Português, e, por isso, acho que não teria graça visitar países onde só pudesse me comunicar com guias turísticos e porteiros de hotéis. Acho imprescindível a fraternidade do boteco, a leitura do jornal local, a audiência direta dos nativos. Conhecer um país através de imagens, filmes, vídeos e agências de viagens nunca me atraiu. Talvez porque sempre fui vidrado na pesquisa de fontes primárias, de livros e documentos originais.
De resto, os encargos de família não foram leves, enquanto eu era jovem. Com 7 anos de casamento, eu e a Nezinha já tínhamos três filhos. Quando já estávamos mais folgados, à beira dos 40 anos de idade,  convocamos mais dois para enriquecer a caravana. Excetuado um curto período, entre a infância do Miguel e o nascimento do Fernando, sempre havia um traseiro sujo a reclamar cuidados e fraldas por trocar. Isso matava eventuais pretensões turísticas que aliás não cultivávamos, nem eu nem a Nezinha . Basta dizer que moramos l ano e meio em Quaraí, na fronteira com o Uruguai, e nunca fomos sequer a Montevidéo. 
Dispensado do sacrifício dos vôos prolongados, dos aeroportos, das estações rodoviárias e ferroviárias, das bagagens, da compra de passagens e das operações de câmbio, delego todas essas torturas aos meus filhos, que amam viajar e galopar pelo mundo. Dou-lhes procuração para que viajem por mim à foz do Prata, ao Caribe, à França, ao trepidante São Paulo e até à Indonésia... Um neto corajoso já foi sozinho à Patagônia e, mais tarde, à Islândia.   Eles me transmitem todos os ensinamentos que eu desisti de assimilar e me repassam emoções de que eu me poupei. Agora esteve o Miguel com mulher e filha em Portugal, fazendo uma viagem maravilhosa, que, esta sim, causou inveja a este velho lusófono e lusófilo, devoto de Camões, de Guerra Junqueiro e Eça de Queiroz. O filho chegou ao histórico promontório de Sagres, sede da escola náutica de Henrique, o Navegador, foi tocado pela emoção de contemplar o Mar Oceano do alto daqueles rochedos, e sentiu o desafio que ele representava para os homens do século XV, que ainda estavam descobrindo os segredos de velejar, de medir longitudes, de ler cartas náuticas e de sobreviver às tempestades. Acho que a emoção do Miguel foi a mesma que me atingiria se eu lá estivesse. Deve ter sido um fiel e “bastante procurador”.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caro José Alberto, gostei muito da crônica do Dr. Sérgio.
Ele, sem viajar acompanhou tudo que lhe interessava através de relatos dos filhos e netos.
Isto é muito bom porque faz a imaginação trabalhar e ter uma visão da realidade.
Um abraço, Hunder

Carlos Ribeiro disse...

Como sempre, uma leitura super agradável. Abraço.