terça-feira, 23 de junho de 2009

Mais currículo menos diploma

O jornalista Lino Tavares, de Alegrete, tem freqüentado as colunas de opinião de alguns jornais do Rio Grande do Sul e de Santa Catarina, protestando contra a decisão do Supremo que cassou a exigência de diploma de Jornalismo para o exercício da profissão. Acredito que essa medida seja uma forma de autodefesa de Suas Excelências quanto à demanda – provavelmente uma enxurrada - que por certo deve estar acontecendo, de processos pendentes sobre aquela irregularidade. Parece-me que assim eles estariam retirando o sofá da sala, caso contrário não perderiam o precioso tempo de suas atividades para discutir o sexo dos anjos dessa questão.
********************************************************************* Então me acode a idéia que se começa a esboçar da profissão de escritor a ser regulamentada através dos cursos de graduação em Letras existentes em várias universidades do país. Ora, escrever bem e corretamente é um dom que prescinde de qualquer exigência de diploma, porém, requer uma prática e disciplina constante para se obter um contínuo aprimoramento. E as Oficinas Literárias estão aí para abreviar esse aperfeiçoamento para os mais talentosos, além de formar leitores melhor preparados para percorrer os rumos sinuosos da arte da escrita. E o resto é autonomia de voo.
********************************************************************* Em qualquer profissão liberal, assistimos cotidianamente o desvirtuamento da instituição do diploma de curso superior em que muitos formados se vem às voltas na luta por uma colocação no mercado de trabalho, sujeitando-se a exercer funções não compatíveis com o seu preparo (p.ex.: farmacêuticos/balconistas), já que lhes falta a experiência necessária e a oportunidade de treinamento adequado nas empresas procuradas, cujo maior interesse concentra-se no candidato já pronto.
********************************************************************* E muitas vezes as grandes realizações do gênio humano processam-se por meio de gente comum que apenas dispõem do seu extraordinário bom senso e sentido de observação da Natureza, como é o caso daquele jardineiro e assistente negro do Dr. Christian Barnard, no pioneiro transplante de coração ocorrido na África do Sul. Em plena época do apartheid racial vigente naquele país, esse cidadão propiciou todas as condições para que aquele cirurgião se tornasse uma celebridade mundial, revelando-lhe as técnicas rústicas das operações bem sucedidas que costumava efetuar em animais. Isso que a sua aparição nas fotografias da equipe do Dr. Christian era sempre escamoteada do público, sem que ao menos lhe fossem proporcionadas melhores condições de vida – humilhado no gueto em que morava com sua família. Embora tardiamente, o reconhecimento de suas habilidades veio-lhe com a outorga do Diploma de Doutor Honoris Causa pela University of South Africa.
********************************************************************* Outro exemplo marcante que posso revelar, diz respeito a meu tio e pai de criação – Cantalício Resem – autodidata alfabetizado até o 3º. Ano primário por seu progenitor; aprendeu Geografia com os selos que juntava nos envelopes descartados da correspondência em seu emprego; um dos idealizadores do curso de alfabetização 20 de Setembro, em Jaguarão-RS; jornalista panfletário d’A Situação; viria a tornar-se Juiz de Direito nessa cidade, por nomeação - a qual tentou declinar, mas que foi intimado a assumir - do então Presidente do Estado, Dr. Carlos Barbosa, chegando a ter elogiados seus despachos em julgado por eminentes desembargadores no Tribunal de Justiça. Ele sempre me aconselhava a ler bastante para que escrevesse bem – com a leitura podes até dispensar a gramática. Ao meu saudoso primo e irmão de criação, seu filho Anysio de Souza Resem, coube-lhe o encargo de dar continuidade à editoria do jornal A Folha, outro dos seus empreendimentos. Sem nunca ter obtido um diploma sequer.
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Resumindo: as Faculdades de Comunicação devem continuar burilando a competência dos mais aptos para concorrer em condições mais vantajosas pelas vagas disponíveis.

4 comentários:

Anônimo disse...

Lamento desapontar os defensores do Diploma de Jornalista, mas sou a favor da decisão do STF pelo simples fato de que não vejo problema em um jornalista trabalhar sem diploma. O ideal é esse, mas não vejo como condição, e sim como um qualificador.

Os jornalistas que se levantam contra tal medida estão, na sua maioria, apenas agindo de forma corporativa, com medo de perderem as suas vagas para "colegas" não formados em Universidades.

Sobre isso, tenho a comentar que:

1. As empresas continuarão a dar emprego preferencial para quem tem faculdade, pois a tendência - a tendência - é de que os formados estejam mais bem-preparados e portanto mais habilitados para o mercado de trabalho, o que nem sempre - nem sempre - é verdade. Vi colegas de curso receberem diploma sem estar preparados sequer para o convívio social, imagine para trabalhar na imprensa.

2. As empresas que derem trabalho indiscriminanadamente para os não formados, só para economizar nivelando por baixo... bom, se isso acontecer, será um belo motivo para um jornalista sério não trabalhar nesse órgão picareta. Os bons jornais, emissoras e afins sempre vão dar preferência aos mais competentes, pelo menos essa é a lógica. Se ela não prevalecer, bom... aí será o momento ideal para se começar a exigir diploma não só dos empregados, mas também dos empregadores...

3. O Dráuzio Varela, o Nelson Motta e outros tantos competentes não têm diploma de jornalista, o que não os torna menos aptos a atuarem na mídia. Pelo contrário, trabalham melhor do que muito diplomado por aí. Já a recíproca não é verdadeira, visto que sabemos que um médico tem que ser formado, assim como um dentista, um engenheiro, etc.

4. Sinceramente, acho curioso que tantos jornalistas e entidades de classe, inclusive algumas que costuimam detestar jornalistas, se preocupem tanto com jornalistas que venham a trabalhar sem diploma, mas jamais se mostram incomodados com o destino que alguns colegas têm dado ao diploma, atuando em programas duvidosos de rádio e televisão ou prestando assessoria para qualquer um, na base do "pagando bem, que mal tem?".

5. Tenho 3 diplomas, portanto me sinto à vontade para falar. Essa é a minha impressão do momento e me presenteio com o direito de mudar de idéia, se os argumentos mostrarem que tô viajando...

Abraço e bastante lenha na fogueira.
Marcello Campos

cabeda disse...

Souza, o meu saudoso amigo Carlos Reverbel, jornalista de profissão, dizia-me que era impensável os grandes jornais franceses pedirem diplomas de jornalismo (segundo ele, nem havia esse curso universitário) para os seus profissionais...
Ele morou muitos anos na França e lá voltou várias vezes.

Lino Tavares disse...

Bom dia, boa tarte ou boa noite a quem estiver lendo esta mensagem, no horário em que for.
Na qualidade de autor das matérias a que se refere esse Blog, devo observar, do alto dos meus 35 anos de jornalista diplomado, que não estamos sendo corporativistas ao defender a nossa profissão, pois, afirmar isso seria o mesmo que dizer que um sindicato age de forma corporativista aos defender os seus sindicalizados. Trata-se de defender um direito inalienável, instituído no tempo em que havia governo sério, honesto e competente no Brasil, predicados esses que se estendiam aos três poderes da Repúlica, com as desonrosas exceções de sempre, já que falo de seres humanos. O nosso protesto não é contra todos os que atuam na mídia, pois aos profissionais das áreas técnicas e científicas, a lei, sabiamente, reservou-lhes o direito de difundir suas idéias e opiniões nos veículos de comunicação. O jornalista não é um "sabe-tudo" e por isso há espaço na mídia para todas os comunicadores das áreas específicas, como o Dr. Dráuzio Varela e outros citados aqui.
O que lamentamos nessa atitude irresponsável do STF - o mesmo do bate-boca entre ministros - é permitir que as funçõe de caráter essencialmente jornalístico (editor-chefe, redador, repórter, revisor e outras) possam ser exercidas por quem para isso não se preparou. A guisa de analogia, vale lembrar que existem mestres-de-obra que dispensam a presença de engenheiros, na construção civil. Mesmo assim, seria leviano e irresponsável decretar que não é mais necessário engenheiro civil para a constução de prédios, pontes e correlatos. No meu tempo de estudante, muitos colegas clamavam pelo fim do Regime Militar. Mal sabiam que, a reboque dessa falsa redemocratização, viria também, 25 anos depois, o fim da profissão pela qual optaram. Ou será que pode ser chamado de profissão aquilo que está ao alcance até de um político semi-analfabeto, como os que temos hoje nos altos escalões do poder ?
Deixo aqui o meu e-mail para qualquer contestação, já que me considero um "democrata",não desses que como tal se intitulam e, quando chegam ao poder, agem como ditadores, comprando congressitas e instituindo leis contrárias aos intesses da coletividade.
Um abraço a todos
jornalista Lino Tavares
Poeta e compositor, nas horas vagas.
her-tavares@hotmail.com

Diasper disse...

Sou professor de música diplomado e músico. Vejam bem a ordem em que coloquei minha formação. Professor de música é uma profissão completamente diferente da de músico.
Para poder ministrar aulas de música em escolas de música particulares, basta fazer uma prova de 20 minutos, da qual é aplicada pela ORDEM DOS MÚSICOS DO BRASIL. Assim, paga-se uma anuidade de 100 reais, e torna-se habilitado para dar aulas de música.
Todavia, essa instituição não funciona e não é capaz de avaliar se um profissional está habilitado a MUSICALIZAR uma criança, um adolescente ou um adulto. Ainda mais com uma prova de 20 minutos.
Estudei, em minha faculdade de música, matérias como Psicologia da educação, Fisioterapia preventiva de LER (lesão por esforço repetitivo), entre diversas outras matérias importantíssimas, das quais temos que entender para não ensinar erradamente ou até mesmo prejudicar a saúde de uma criança da qual os pais confiam sua educação a nós, professores de música.
Já trabalhei em escolas de música das quais os professores tinham o "dom" para ensinar, todavia, não sabiam se quer da existência de estudos científicos para evitar tendinites, ou para motivar os alunos ao estudo de seus instrumentos.
Todavia, para ser músico, o maior perigo que pode haver é o de levarmos "tomatadas" do público. Um músico sem diploma pode ser um ótimo compositor. Temos Beatles, Rolling Stones, e quase toda a grande maioria desses "gênios" da música sem ter colocado um pé se quer na faculdade. Mas questiono: será que uma faculdade poderia prejudicar suas práticas composicionais?
Para os amigos que não sabem, existe faculdade de composição musical. Nem todos que fazem essa faculdade tem o "dom" de compor.
Concordo plenamente que para escrever bem, não é necessário faculdade de letras, jornalismo, ou qualquer outra da área. Contudo, admitir-se que os cargos de responsabilidade de revisão das notícias/informações que nos serão transmitidas, é um atentado, uma calamidade tão grande quanto a de termos um presidente semi-analfabeto, do qual se quer consegue esconder as corrupções de seu filho e seus "nomeados".
Minha classe profissional, a de professor de música, lutou por 2 anos pela aprovação da LEI que obriga aulas de música no ensino fundamental e médio. Ganhamos essa batalha, da qual em 2011 todas as escolas tem que estar adequadas. Inicialmente essa lei obrigava que fosse um professor especialista em música para ministrar as aulas. Nosso querido presidente da república anulou esse parágrafo e falou que qualquer profissional formado em ARTES pode ministrar as aulas de música. Minha nossa, quem estuda artes cênicas tem competência para ensinar música?
Concordo plenamente com o jornalista Lino Tavares, pensando eu que para escrever, não necessita-se de diploma, mas para ser responsável em "filtrar" os conteúdos que vão para a mídia, precisamos de especialistas que tenham estudado para isso.