Grande ator
do teatro rio-grandense, natural de Jaguarão, Joberto Teixeira levou à cena, no
Teatro Esperança, o monólogo “As Mãos de Eurídice”, a mesma peça com que foi
aplaudido de pé no principal palco do nosso Estado – o São Pedro, de Porto
Alegre. Fiquei sabendo, através de uma emocionante crônica do Professor Cléo
dos Santos Severino publicada no jornal “A Folha”, lá pelo fim dos anos cinquenta,
que o espetáculo foi realizado para uma restrita plateia, mas que no dizer
desse articulista com a presença de um casal de idosos, nada mais nada menos
que os pais daquele artista, lotavam todo o espaço vazio daquela casa, dada a
feliz oportunidade deles assistirem a magistral interpretação do seu talentoso
descendente.
Outro momento
mágico do nosso Cine Teatro Esperança me foi relatado pelo saudoso amigo Newton
Silva, quando ali se apresentou o notável cantor e compositor Rubens Santos, já
falecido, um dos parceiros de Lupicínio Rodrigues, então cumprindo uma turnê
artística patrocinada pelo Governo do Estado, provavelmente acertada pelo
empreendedor Danilo Brum, o qual integrava o Conselho Estadual de Cultura. Pois
o Newton me enfatizou que esse espetáculo foi dirigido a uma meia dúzia de
assistentes, os quais chegaram a sentir pena de tantos ausentes que deixaram de
conferir um dos mais abalizados intérpretes do velho Lupi. Compreendi
perfeitamente essa colocação, tendo acompanhado o veteraníssimo Rubens em
inúmeras performances no antigo restaurante do CIB – Centro Ítalo Brasileiro,
situado na Rua João Teles, bairro Bonfim, que costumava reunir às
segundas-feiras a nata da música rio-grandense, ocasiões em que abusava de sua
potência vocal, sem utilizar qualquer microfone.
Os tópicos
acima transcrevi de crônica aqui publicada em 28/11/2010 e intitulada “Vivenciando
instante privilegiado”. Feito esse reparo e aproveitando a deixa, ocorre-me uma
passagem que me contaram sobre o desempenho do radialista Wilson “Catico”
Almeida, filho da terra que ousava desafiar o dito “santo de casa não faz
milagre”, representando naquele palco o difícil monólogo de Pedro Bloch, tantas
vezes levado à cena pelo famoso artista Rodolfo Mayer, da Rádio Nacional do Rio
de Janeiro. Disseram-me que os invejosos de plantão se combinaram para lotar o
Esperança a fim de lhe contemplar com uma estrondosa vaia. Mas o que se viu, ao
final, foi uma longa e calorosa aclamação de todo o público ali presente.
Aqui já andei
falando daquela ocasião em que tio Cantalício me levou para assistir a uma peça
no Teatro, da qual teve que se
retirar mais cedo porque eu comecei a bater pé como fazia nas matinês do
cinema. Ou então daquelas vezes em que, ainda garoto miúdo, insistia com meu
primo Anysio, já moço taludo e namorador, que me levasse nas noites de
segunda-feira ao Cine para assistir aos seriados do Tom Mix e, já na outra
semana, era ele quem vinha me perguntar se eu não ia ver a continuação do
folhetim. Vendo as chanchadas da Atlântida, impressionava-me com a
interpretação de Silva Neto para Nervos
de Aço, cuja autoria ignorava fosse de Lupicínio Rodrigues, ilustre
desconhecido para esse analfabeto musical.
E a ZYU-7 Rádio Cultura de Jaguarão tinha
seus programas vesperais de calouros, aos sábados, ali apresentando as atrações
locais, onde pontificavam o regional dos filhos do seu Agostinho – Canhoto, Lourenço e Moacir – e mais o violonista
Nery Antonini, além de Napoleão, Severo e Adalberto Mendes, notáveis
seresteiros, cuja fama se propagava por toda nossa Zona Sul do Estado,
estendendo-se Uruguai adentro.
Finalizando
esta lição de casa, para descontrair, um episódio hilário. Uma tremenda
bofetada ecoa pelo recinto e lá da galeria (“poleiro”) alguém grita: “Afofaram
o Adem!”. A projeção do filme é interrompida, acendem-se as luzes da plateia e,
lá de baixo, ressoa o brado do melindrado dengoso: “Que ovo!” Acústica
perfeita, surgia mais uma das expressões típicas do “jaguarês”...
E o resto
fica a cargo das memórias vivas de Cláudio Ely e Pedro Bartholomeu.
4 comentários:
Mais uma vez, impecável nas suas lembranças transformadas em letras. Hoje estive no Instituto Histórico e Geográfico de Jaguarão onde digitalizei (fotografei) muito material. Quando for catalogar o material, talvez ache alguma notícia sobre estes momentos citados em sua rememoração. Grande abraço ao PoetadasÁguasdoces.
É lamentável que Jaguarão nunca prestigiou seus artista, tanto na literatura, como na arte e até no futebol. E as apresentações no Cine Theatro Esperança bem demonstram esse descaso com seus filhos.
Meu caro amigo: não creio que fosse apenas em Jaguarão que não se valorizasse as pessoas. Alguém que carregasse um violão naquela época já era tido como malandro. É muito interessante teu texto. Ainda hoje os melhores artistas para os jovens são os estrangeiros que cantam algo que além de ruim como melodia e harmonia não é entendido como letra
Prezado amigo Joalso, a quem tive a honra de conhecer e admirar no ano passado no feliz encontro em Florianópolis. Gostei também deste seu texto, que bem poderia chamar-se "Retalhos históricos de minha terra". Jaguarão deve sentir orgulho deste filho. Parabéns!
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