segunda-feira, 6 de agosto de 2012

UM GURI EM BUSCA DE AVENTURA

Meus sonhos me aprontam cada “gancho”! Pois não é que me deparo com uma comadre que falava para outra ter lido no jornal uma reportagem sobre os perigos aos jovens saindo a cavalgar fora da cidade. “Peraí, eles passeavam a cavalo dentro da cidade?” – estranhei, quase invadindo a cena. Porém, veio-me à mente uma de minhas estadias na cidade de Tapes - RS, situada às margens da Lagoa dos Patos e considerada a mais plana ao nível do mar, onde constatei não ser incomum esse costume, mesmo fora do tradicional desfile no feriado comemorativo de 20 de setembro.
Nada mais natural para que se favoreçam longas caminhadas a pé ou pedaladas de bicicleta, apesar do comodismo daqueles que não dispensam o automóvel para se deslocar em pequenas distâncias. E do lazer daqueles que ainda têm como alternativa a prática da equitação no perímetro urbano. Sem submeter suas montarias a grandes esforços, os ginetes também desfrutam de um prazer mais ecológico e saudável. Eles circulam nas vias públicas, inteiramente despojados de qualquer pretensão de impressionar com suas esporádicas passagens, que nem chegam a ser notadas no passeio.
Essa conversa das comadres falando do inconveniente dos jovens pegarem a estrada montados em seus pingos me jogou em tempos distantes quando minha cidade parecia pequena demais para minhas perspectivas de vida. Jaguarão era o universo a que me restringia como se não bastassem minhas explorações pelas ruas, quando as percorria de cabo a rabo, uma por uma, às vezes, tentando chegar a pé nas vilas mais pobres e afastadas, em busca da aventura de sentir a realidade de outras paragens. Quantas vezes não me detive ali no Prado, querendo prosseguir pela saída da cidade.
Houve ocasiões em que alugava bicicleta para prolongar esses trajetos. Mesmo assim, essas novas expectativas não passavam de entradas Uruguai adentro, pela ponte cruzando o rio e seguindo na direção da Cochilla para trazer “pan alemán” ou então esticando mais até o cansaço me parar lá pelos lados da Tablada. Outras vezes, a gente pegava um pequeno bote para navegar rio acima, onde nos perdíamos num dos inúmeros braços e ficávamos horas dando voltas, sem a mínima orientação, apenas na base de tentativas para encontrar o caminho de volta ao curso principal das águas.
Um dia havia de chegar a que surgisse oportunidade de sair daquele insulamento e lá fui eu de carona num "jipão" do Exército, a convite do primo Cesário, para passar uns dias em sua residência de Bagé, onde servia numa das guarnições locais. Pelo caminho, a estadia no Paris Hotel, de Pelotas, contemplava pela janela entreaberta do quarto em que estávamos hospedados a imensa torre metálica do relógio do Mercado Público, cujo carrilhão batia preciso as horas. Eu começava a desbravar o mundo...

9 comentários:

Academia de Letras de Crateús - ALC disse...

Poeta, memorialista, naturalista...
Sua linguagem me traz a paisagem e a brisa do belíssimo Sul....
Um dia retornarei a rever o Guaiba e quem sabe conhecer sua cidade naral, Jaguarão do Sul.

Marco Aurélio Vasconcellos disse...

Muito bom, Souza.
O conteúdo do teu texto dá saudade das coisas do interior de nosso pago bendito.
Abraço forte.
Marco

Ana Maria Silva disse...

Amigo Souza, que lindo, deu até saudade do "Cacique" meu querido petiço, o qual encilhava todos os dias para ir ao colégio. Abraço.

Luiz Mauro Pinto Costa disse...

Muito bonito, Souza.
Me trouxe lembranças boas, da época de piá, quando meu pai nos levava (minha mãe, minha irmã e eu) até Gravataí, no sítio de uns tios, onde ficávamos uns 10 dias, curtindo campo, mato, açude, tambo de leite ... saudade boa, essa.
Grande abraço.

Norberto Peres disse...

Querido amigo e conterrâneo.
Não tive toda essa felicidade que relatas, pois meu pai militar foi transferido para Bagé e assim minha infância/adolescência aconteceu em sua maior parte em Porto Alegre. Mas o destino quis que eu conhecesse, namorasse, noivasse e casasse com uma jaguarense e depois de noivo voltei a Jaguarão e, incrivel, me sentia como se nunca tivesse saído de lá. É a força da terra e o orgulho de ser jaguarens.
A propósito, sugiro seu apoio para organizarmos uma "seresta" em Jaguarão, pois seria para mim uma felicidade enorme cantar na nossa terra. Um abração.

Clarice Villac disse...

E lá vamos nós, imaginando como passearíamos por esses lugares encantados do sonho e da memória do amigo José Alberto...

Conseguimos nos sentir como o guri, palpitando por conhecimentos do mundo, buscando entrever a realidade mais além do cotidiano...

Esse menino que subsiste, alegre em nosso amigo !

A propósito, eu iria a cavalo passear por essas paragens... se o cavalo concordasse e estivesse bem disposto e feliz.

Poeta disse...

Caro amigo, eu acho que o menino sempre vive dentro da gente, principalmente quando somos poetas...

Se não fosse esse fato de a memória guardar as melhores recordações, o que seria de nós, meninos crecidos?

Abração do poeta e jornalista

Valdeck Almeida de Jesus
www.galinhapulando.com

Anônimo disse...

Querido Zezinho,
Gostei muito e senti muitas saudades das aventuras da adolescência em nossa natal Jaguarao.
Abraços, Helena.

Anônimo disse...

Belo texto para encerrar o madrugadão! Fui junto com você nestes igarapés e dei voltas pelos afluentes até achar o leito principal. Não me arriscaria como Clarice Villac a montar, ainda que fosse um petiço, mas só a viagem imaginária já valeu. Abraço grande!
Fatima/SC
P.S.: Nesta sexta-feira mandei pra Getúlio Vargas uma coletãnea. Desejo que chegue rápido e que vc goste.