segunda-feira, 23 de julho de 2007

A garota da Rua São Manoel

O bairro Partenon, durante muito tempo, foi meu chão em Porto Alegre, acompanhando as freqüentes mudanças daquela minha nova família. Assim, tive oportunidade de me fixar na Rua Veador Porto, esquina com a São Manoel, defronte ao campo do Geral. Ali perto, tinha uma parada onde eu costumava embarcar no ônibus que me conduzia até o Julinho, sempre por volta de meio dia e meio. Todos os dias, aquele horário coincidia com a passagem de uma garota moreninha, muito graciosa em seu uniforme de blusa branca e saia cinza, provavelmente na saída de uma escola das proximidades, que me tentava com um sorriso sedutor. E eu resistia naquele meu dilema entre perder a primeira aula ou conferir o interesse que ela parecia demonstrar por mim. Até que me transferindo para a Rua Aurélio Porto, deixei de ver a moreninha.
No Colégio, formávamos uma turma da Retaguarda – Nelson Fetter, Jerson Mariante Vieira, Hiparcus Raupp, Gisberto Ingolf Rolff, Flávio Antunes Graziuso e eu – que se deslocava, diariamente, na infantaria dos finais de tarde, desde a Avenida Piratini, na Azenha, até Partenon e Glória, onde se situavam nossos lares. Certa ocasião, vínhamos pela Bento Gonçalves e, cruzando a Luiz de Camões, o Hiparcus, que era o galã do grupo, exclamou: olhem só aquela guriazinha dando bandeira pra gente, eu vou lá... Não mesmo, disse eu, pode deixar que é comigo. Era a moreninha, tinha chegado a minha vez e não ia desperdiçar. Encostei-me a ela, pedi licença para acompanhá-la, ela disse que sim, seguimos caminhando lado a lado, nem chegamos a nos apresentar, apenas declamei:
Perfil carinhoso deste rosto querido
que me inspira somente uma musa divina,
quisera ser algum artista comovido
a reproduzir o teu olhar que me fascina.
Faria todas mais bonitas telas do mundo
se meu pincel guiasse-lhe Da Vinci genial
e lapidaria tua forma escultural
moldada assim no gesso de modo profundo.
Mas n´alma só me brota pobre sentimento
que nunca conseguirei dar a conhecer
embora venha ser objetivo que tento.
E, por tal motivo, aqui procuro escrever
essas palavras que, há de levar, o vento,
pura pretensão de ser poeta sem o ser.
Paramos na Igreja de Santo Antônio, ela falou que ficava por ali, discretamente se despediu e eu me esqueci de combinar um novo encontro. No outro dia, cercado pela patota, foi o Hiparcus quem traduziu o pensamento de todos: Pô, Jaguarão, tu é mesmo peitudo...